Histórias curtas de uma longa pandemia – 3

Por: Hal

Humaninhos

Esta história não aconteceu comigo, foi contada por um amigo, engenheiro civil. Na época ele estava na faculdade de engenharia o que foi em: faz tempo pra caralho.

A faculdade estadual tinha dois núcleos, Humanas e Exatas. De um lado o pessoal do CRUJ™ (Comitê Revolucionário Ultra Jovem™) com suas bolsas de crochê, miçangas e cigarrinhos de maconha. Do outro o pessoal do Cálculo que sonhava com bocetas e derivadas, enquanto exibiam orgulhosos suas HP 48s. Cada um na sua, como deve ser.

Acontece que de tempos em tempos a faculdade fazia uma espécie de festival aberto para que os alunos demonstrassem suas expertises para a população local. No melhor estilo: Veja onde seu dinheiro está sendo gasto.

Descubram o Hal

Salas de pintura, de ensaio de materiais e de experiências com física. Praticamente uma Feira Stark de pobre.

Naquele ano o pessoal de humanas do núcleo de artes decidiu fazer uma exposição de fotos “artísticas” E o que é mais artístico e transgressor que um nu feminino. Não?
Segundo informações, escolheram a menina mais gostosa da sala!
Universitária deslumbrada em brincos de pena com bunda e peitos fenomenais.

E assim foi feito.

Era 100% original assim

Uma sessão de fotos completa. Puro creme de nu feminino. Em nome da arte e da pureza da alma infantil do ser humano. Ou alguma merda assim.

E por falar em merda. Deu merda né?
O pessoal GoT do primeiro ano de exatas ficou sabendo da tal sessão de fotos e antes da abertura e meio que invadiu a sala de artes para conferir o material.

Todo mundo queria ver a menina pelada! Quero até hoje (suspiro)

Foi um fuzuê. Como diria um velho amigo: Arte é minha rola. Olha que peitos!

A sala ficou cheia. Todo mundo tecendo “elogios” para os atributos da moça enquanto o propósito da crítica social contemporânea baseada nos princípios de Jean-Paul Sartre. Bom… Ficou só na proposta mesmo.

O pessoal de humanas ficou puto! Aquilo era um desrespeito com o corpo feminino! Misoginia pura! Do outro lado o povo de exatas era só alegria.

TRIGGER!

Como a coisa tinha virado bagunça, os professores responsáveis foram chamados.

De um lado o povo que defendia que aquilo era arte e merecia respeito, do outro o pessoal do: Mostrou o peitinho e não quer que ninguém veja?

A menina das fotos chorava copiosamente, os amigos tentavam consola-la dizendo que aquilo era o exemplo perfeito do quão tóxica nossa sociedade havia se tornado e que aquele episódio levantava um debate maior sobre o patriarcado.

Os professores de humanas exigiam uma retratação pública! Os professores de exatas argumentavam que a molecada só estava querendo ver uns peitos e já iram embora.

O negocio foi ficando tão chato, que já estavam cogitando não fazer mais a feira.
Foi quando chegou o pessoal de engenharia do terceiro ano.

E só para contextualizar, esses caras já tinham apanhado muito da vida. A maioria já trabalhava na área além de estudar o que lhes dava uma visão bem pragmática de tudo.

Engenharia do terceiro ano. Quase Uber!

Depois de olhar as fotos e escutar o chororô que se desenrolava, um dos caras mais velhos da engenharia, parou, pegou as fotos, analisou o problema e…

Picou todas! Rasgou-as num punhado só. E entregou para um rapazinho de humanas.

Todo mundo parou! Ninguém falava nada. O povo de humanas incrédulo, o povo de exatas do primeiro ano com medo.

O cara se virou e disse:

-Sem foto. Sem problema.

Virou e saiu.

Naquele ano o pessoal de artes mudou o tema da exposição em cima da hora.

Author: Eric Mac Fadden