Útil para a sociedade

Artur estava cansado. Teve de entregar muita cesta básica pelo iFood esse mês e se sentia exaurido. Mesmo ainda devendo 1/4 de sua meta diária, resolveu sentar-se próximo à fila dos esfomeadostermo cunhado após A Grande Fome em 2037, após a Guerra da Água que destruíra os EUA em 2035 e tornando-se um grande chão de fábrica para coalizão China-Rússia-Índia, sem contar a costa mexicana que já estaria gerando problemas novamente – trabalhar para estatal nesses dias até fazia suas vítimas dependendo do que o governo decidiria quantos passariam necessidade devido às exportações para o exterior. Ter 57 anos nesses tempos era mais do que perigoso e uma tarefa quase impossível, apesar da aposentadoria ainda ser dos poucos direitos, a idade mínima seria de 95 anos.

Começou a pensar nos tempos que utilizava a internet para procurar entretenimento instantâneo e o SlaveGPT que facilitou tanto seu trabalho como engenheiro florestal, cuja função fora totalmente substituída pela AI, assim como jornalistas e o congresso nacional. “Tivemos de aceitar muita, mas muita merda“, pensava consigo mesmo relembrando quando um grande avanço tecnológico tinha sido feito para prolongar a vida humana por causa das AI e sua vertiginosa evolução em apenas um ano. Mas obviamente apenas os muito ricos poderiam obtê-la, então isso era basicamente uma exclusividade das elites que governavam os países – apenas existia o modelo totalitarista agora, democracia havia se provada um fracasso tão grande que foi considerada tabu no mundo todo – e o Grande Líder Sibas era mantido por tal tecnologia, após ter sobrevivido à uma simples pneumonia em 2023 e abolido as eleições em 2024, e assim foi com os outros governantes da época. Chamariam de ditaduras nos áureos tempos, quando o povo ainda tinha alguma poder de decisão se não o de onde esconder quando a chuva chegasse – esta em sua maioria nociva nos grandes centros urbanos. Vadim continuaria a governar a Rússia com punhos de ferro e Chang, que se recusara a sofrer alterações, ainda estava vivo e comandando a tripla aliança.

O comércio ainda existia, mas sempre controlado pela AI que geria a infra-estrutura financeira do país, tudo realizado via tokens nos mesmos modelos das antigas criptomoedas, porém na América Latina inteira usava-se o iReal – já que nos tornaríamos a única nação que não entrasse em falência e colapso na região, algo que ocorreu muito rápido após a revolução das AI.

Artur mastigava vagarosamente sua barra de proteína – proveniente de lentilhas e grão-de-bico, já que a de origem animal era restrita aos três países dominantes na Terra – e lembrava como tínhamos uma falsa sensação de liberdade e quanto prezávamos por isso mesmo sendo um embuste. Mas agora vivemos num sonho onde o raciocínio lógico fora massacrado após o KlikKlok ter adquirido todas as redes de rádio e TV em 2027 e no ano seguinte, as plataformas de streaming – visto que por falta de dinheiro em áreas como saúde e pesquisas de abastecimento de água, todos os países não-aliados tiveram de passar sua internet for infra-estrutura chinesa também e pagaram com que havia de mais inútil: suas mídias – e substituído por inteligências artificiais especializadas nos assuntos mais diversos: de medicina ao que os governantes decidiram que seria a sociologia.

Ao terminar de mascar sua refeição – uma das duas que tinha direito por ser funcionário público – olhava para o escaldante sol do inverno goiano e nostalgicamente recordava de quando chegava em casa e partia para a jogatina com sua tão almejada GPU, que adquirira com tanto suor naqueles tempos onde as criptomoedas ainda podiam ser mineradas em casa, mas os chineses e russos as pegavam direto da fonte para gerar dinheiro do nada. Os pequenos cybercrimes começaram a cessar em meados de 2030 quando o cidadão comum parou de ter acesso à internet e à tecnologia. Smartphones se tornaram um luxo e as operadoras faliriam todas antes disso. Mas as AI continuariam a fazer o mundo rodar, pois era do interesse estatal mantê-las, os recursos eram desviados à elas para manter suas previsões, estudos e gerenciamento mais eficiente das massas – tudo essencial à elite.

A última GPU fabricada fora a FTX 8090 com 128GB de VRAM em 2028. Consumia 1300W sozinha e custava o mesmo do que uma casa modesta. Artur jurava que havia visto uma vez um caminhão indo entregar uma dessas, que assistira os dois funcionários descarregando o pallet do caminhão e o técnico de refrigeração ligando as tubulações ao sistema de ar condicionado dedicado do lado de fora da mansão.

Assustado, percebeu que já faziam cinco minutos de sua pausa de três minutos para o almoço. Rapidamente colocou seu capacete e subiu na moto elétrica que puxava o container de cestas básicas. “O Estado não pára, por quê você pararia?” – dizia o slogan ao lado da grande caixa com duas rodas. Artur se afasta na avenida em meio das pessoas andando e desviando da massa que apenas queria um objetivo ou o mínimo de conforto, mas é a vida hoje em dia. Ou o que sobrou dela.

Fonte: The Byte Bing Image Creator

Author: Eric Mac Fadden