Segunda-feira à pino, prévia de jogo do Brasil. Todos querendo chegar em casa para cumprir seu ato patriótico às 13h e lá estava seu Valmir, aposentado, 67 anos de rugas laborais, guiando no seu Celtinha 2014…
Era um carro bem usado, mas muitíssimo bem conservado, impecavelmente limpo e de baixa quilometragem, daqueles que dão orgulho alheio aos estranhos que vislumbram sua passagem. Seu Valmir seguia tranqüilo de volta ao lar para tentar aproveitar um pouco o resto da sua tarde. Infelizmente ele vive no Brasil e, vez ou outra, é sorteado pelas agruras do caótico trânsito da cidade grande, onde motoristas impacientes colam no seu porta-malas na vaga esperança de que você acelere ou passe por cima do veículo logo adiante, para que o nobre brasileiro nervoso tenha à sua disposição mais uns 3,5m de deslocamento livres para adiantar sua lataria.
Ao longo de três semáforos, um ônibus urbano colara em sua retaguarda, ameaçando uma leve colisão caso este não dirigisse uns 2 ou 3km/h mais rápido. Afinal, logo que aquela rodada terminasse o apressado motorista poderia finalmente parar, pegar sua cerva, churrasco de carne nerventa e curtir o jogo na TV de tubo em um bar próximo ao ponto final. Claro, se pressionasse os veículos a adiantar sua jornada na faixa da direita, mais rápido ele encararia sua beverage mofada de qualidade duvidosa.
Motoristas de ônibus são pessoas experientes e quando querem, conseguem exercer boa pressão contra veículos de menor envergadura… mas não esperava topar logo com seu Valmir. Seus 40 anos de profissão agindo como motorista de uma fidalga abastada, hoje octogenária, ensinaram-lhe a nobre virtude da paciência. Dirigir, para ele, era apenas uma diversão, parte do vai-e-vem diário com a simpática miss Daisy.
No abrir do quarto semáforo, o radiador do ônibus já ia embaçando a placa traseira do seu querido Celtinha 2014 quando na iminência da partida, engasgou assustado ao ouvir a buzina do ônibus logo após o imediato ofuscar da luz verde. Depois de três tentativas de ligá-lo, seu Valmir desceu do seu coche, abriu o capô e tristemente sinalizou com um polegar abaixo ao motorista do ônibus que o veículo estava em “pane“.
A um metro de distância do Celta, o motorista do ônibus se viu em problemas. Manobrar aquela enorme massa para contornar o veículo defeituoso seria algo… digamos… trabalhoso.
Seu Valmir prontamente se ofereceu para ajudar no processo de manobra do ônibus urbano enquanto o socorro do seu filho mais velho chegava por ali. Foram longos minutos de manobras complexas até que conseguissem uma janela de espaço suficiente para que o paquiderme metálico, lotado de pessoas apressadas, desviasse à esquerda, furando o tráfego na pista central e principalmente, sem macular o polimento do pequeno Celtinha.
Os passageiros observaram: “Se o senhor não estivesse tão colado no carro da frente, não precisaria dar marcha-à-ré.”, “Vamos logo, motorista! Vê se não anda colado mais, não!“, “Putz, já já começa o jogo e eu não chego em casa“…
Finalmente, derramados alguns ml de suor, o motorista apressado conseguiu contornar o Celta sem bater em nenhum carro e seguir seu caminho… 15 minutos depois.
Passada aquela polvorosa, seu Valmir fechou tranqüilizante o capô do seu amado Celtinha, sentou-se no seu banco limpo e confortável, deu partida sorrindo e seguiu sua viagem para casa…
Que grande professor é o seu Valmir!
Por Monkey